Mimeografia, 260x140mm, 48
pp.,
100 exemplares.
Câmara de Descompressão
Mattia Denisse
texto: Mattia Denisse
tradução: Marta Lança
imagem: João Maria Gusmão e Pedro Paiva
design: Flatland design
︎esgotado
Entramos nesta Câmara de Descompressão porque estivemos demasiado tempo à
superfície. Nela, seremos apresentados a
paradoxos que nos estampam à frente a nossa incapacidade de resolver problemas
banais; a teorias matemáticas que ao organizar o mundo, complicam-no; a
expedições que nos levam (sem sair do lugar) a sítios tão profundos e
insondáveis como são certas memórias. Falta saber se ao sair desta Câmara de
Descompressão, a nossa lucidez e sobriedade será alguma vez recuperada, mal
tomemos de novo o pulso ao mundo que habita fora dela.
︎︎︎︎︎︎
O paradoxo não é mais do que uma tentativa de cortar, provisoriamente, o
fio que liga uma ideia à lógica.
Para se adicionar à lista dos paradoxos, aqui fica o do barbeiro:
Um barbeiro propõe fazer a barba a todos os homens que não fazem a barba sozinhos e apenas a estes. Deverá o barbeiro fazer a barba a si próprio?
Repito: Um barbeiro propõe fazer a barba a todos os homens que não fazem a barba sozinhos e apenas a estes. Deverá o barbeiro fazer a barba a si próprio?
Resolvemos o problema ao afirmar que este barbeiro não pode existir (ou, brincando com as palavras, que não se trata de um homem), o que não surpreenderá ninguém, pois não existe verdadeiramente um paradoxo. Para ser exacto a demonstração precedente constitui a demonstração da não-existência de tal barbeiro. Podemos formular o paradoxo da seguinte maneira: o conjunto dos conjuntos que não pertencem a eles mesmos, pertence a si mesmo?
Mattia Denisse, Câmara de Descompressão.
Para se adicionar à lista dos paradoxos, aqui fica o do barbeiro:
Um barbeiro propõe fazer a barba a todos os homens que não fazem a barba sozinhos e apenas a estes. Deverá o barbeiro fazer a barba a si próprio?
Repito: Um barbeiro propõe fazer a barba a todos os homens que não fazem a barba sozinhos e apenas a estes. Deverá o barbeiro fazer a barba a si próprio?
Resolvemos o problema ao afirmar que este barbeiro não pode existir (ou, brincando com as palavras, que não se trata de um homem), o que não surpreenderá ninguém, pois não existe verdadeiramente um paradoxo. Para ser exacto a demonstração precedente constitui a demonstração da não-existência de tal barbeiro. Podemos formular o paradoxo da seguinte maneira: o conjunto dos conjuntos que não pertencem a eles mesmos, pertence a si mesmo?
Mattia Denisse, Câmara de Descompressão.
MATTIA DENISSE (Blois, França, 1967) vive em Lisboa desde
1999. Estrangeiro ou extraterrestre, Mattia Denisse nunca se sentiu
de nenhum lado. Por não ter paciência para esperar ser condenado por outros ao
exílio, viajou. Pela Europa, África e Brasil, procurando algures o que poderia
ter provavelmente achado se ficasse lá onde estava. Como “é preciso
traficar alguma coisa enquanto se espera que a noite venha”, escolheu a arte ou
a arte escolheu-o, como meio, para sobreviver. Aos 7 anos e meio, instala-se no
meio da planície no campo vizinho com um cavalete e uma tela e pinta uma
paisagem de montanha que forma uma baía, no horizonte, com o mar. Descobre,
espantado, “que a arte é o lugar de todos os possíveis”. Depois da
pintura como iniciação, explorará sobretudo a instalação como “espaço trópico”:
projeto de reconstrução à escala planetária de uma “paisagem paradigmática”. O
conjunto destas obras seria o ressurgir “de um paraíso” do qual se
reencontrasse os fragmentos dispersos à superfície do globo. Em 2006, parte
para Cabo Verde onde experimenta a insularidade. Nesta vida, onde o tédio é uma
condição sine qua non do destino, escreve e desenha, que são,
para ele, dois meios de passar, sem intermediários, de um pensamento a
“qualquer coisa”. De regresso a Lisboa, Mattia Denisse dedicou-se
quase exclusivamente ao desenho e à escrita, trabalho centrípeto em relação ao
lado centrífugo das viagens.