Capa mole c/ 4 capas diferentes, offset, 195x125mm, 176 pp.,
500 exemplares.


O rapaz perdido
(seguido de)
Sem porta


Thomas Wolfe

texto: Thomas Wolfe
tradução: Maria Correia
edição: Rui Almeida Paiva e Sofia Gonçalves
desenhos: Leonor e João Melato Gonçalves
design: Sofia Gonçalves





O centro do Mundo (emocional e por sua vez literário) de Thomas Wolfe é a casa onde em criança viveu com a família. A sua obra desloca-se, em espiral, em torno deste ponto, e por aquilo que o cerca, a cidade de Asheville, de onde nunca saiu, embora tivesse vivido em vários países desde muito jovem. Na presente edição, o centro do Mundo chama-se O rapaz perdido  e Sem Porta.

Em O rapaz perdido, a acção decorre em 1904, na época da Exposição Universal celebrada em Saint Louis. Grover Wolfe, o menino referido no título, tem apenas 12 anos, mas, segundo dizem aqueles que o conheceram, foi abençoado por uma sensibilidade e uma maturidade extraordinárias. Escrita pelo seu irmão mais novo, Thomas Wolfe, a novela conta, em quatro tempos, com quatro vozes distintas e bem diferenciadas, a procura pelo “rapaz perdido”. Apesar de ter sido escrita antes de O rapaz perdido, William Faulkner considerava Sem porta: um conto sobre o tempo e o vagabundo a sua continuação natural. Também aqui aparece o irmão perdido, apesar de serem outros os verdadeiros protagonistas da novela: o pai morto e a casa de família; os rudes condutores que atravessam os Estados Unidos da América de noite com os camiões carregados de mercadoria; um milionário entediado com a sua cómoda vida; os esplêndidos e singulares estudantes de uma universidade inglesa; e um misterioso personagem que, imutável, observa todos os dias o mundo através de uma janela. Contudo, o verdadeiro protagonista destas páginas extraordinárias, é o seu narrador, um Thomas Wolfe que, como ele mesmo confessaria, derramou nelas todo o seu entusiasmo, toda a sua confusão, e todos os seus temores juvenis (sem saber que morreria pouco tempo depois, e ainda jovem). Outubro de 1931, de 1923, de 1926, o mês de Abril de 1928: uma viagem pelo tempo através das estações do ano, pela natureza do país, e por quatro momentos essenciais da vida do autor.


«... tanto O Rapaz Perdido como Sem Porta. Um conto sobre o Tempo e o Vagabundo, reunidos num único volume, são dois pequenos tesouros que, sob a forma de protesto, não deixam de lembrar que há vida além da monocultura da ficção – tanto aquela que corre atrás dos temas da actualidade de telejornal como a outra que, com os seus capítulos curtos e a sua pressa narrativa, se aproxima de uma má série televisiva.»
João Oliveira Duarte, «Thomas Wolfe. Um monumento ao sul», Jornal i (16/04/2020).

︎︎︎︎︎︎


Parecia-me ter voltado a uma sala que sempre conhecera, para descansar durante um momento, deixando dúvidas e perturbações da alma fora da porta, visto que, a qualquer instante que escolhesse, teria apenas de rodar a maçaneta, abrir a porta e entrar numa vida que era minha, tão natural e despreocupadamente como alguém que se atira para o seu cadeirão familiar ao voltar de uma longa viagem.
Porém, nunca encontrei a porta, nem rodei a maçaneta, nem entrei na tal sala. Ao chegar lá perto, não consegui encontrá-la. Estava tão próxima como a minha mão e, no entanto, não conseguia tocar-lhe, a um palmo de distância, se a pudesse alcançar, a uma palavra de distância, se a pudesse proferir. Apenas a um passo, um gesto, e lá estariam toda a paz, a certeza, a alegria—e o lar, doce lar, para sempre—pelas quais ansiava na minha vida, mas eu continuava como um náufrago na escuridão.
Nunca a encontrei.

Thomas Wolfe, «Sem Porta».

THOMAS WOLFE deixou-se envolver, irremediavelmente, numa insistente encruzilhada com a sua biografia. Passados sobretudo na sua cidade natal, Asheville, na Carolina do Norte, os seus livros perseguem episódios repletos de vida, de oralidade, de trejeitos locais, bem como as suas respectivas peculiaridades morais, sociais, tradicionais, fonéticas (com todos os seus tiques involuntários), para reflectir sobre a América rural, profundamente provinciana (até ali ignorada pela maior parte da dita grande literatura Americana), embora filtrados por uma perspectiva sensível. Escritor compulsivo, em vida publica dois romances de grande fôlego, Look Homeward, Angel (1929) e Of Time and the River (1935). Estes dois trabalhos, de dimensões colossais, tiveram a intervenção de Maxwell Perkins, o seu editor de então, que, com o consentimento de Wolfe, realiza cortes nos manuscritos, eliminando inclusive capítulos inteiros, até se tornarem fisicamente vendíveis. Após a morte de Wolfe, foram encontradas, num baú, milhares de páginas. Daí são extraídos dois romances, novamente organizados e pesadamente cortados, desta feita pelo editor Edward Aswell. Perante a fama de Wolfe na altura, rapidamente são publicados com os títulos The Web and the Rock (1939) e You Can’t Go Home Again (1940). Para além destes dois romances, e igualmente postumamente, foram publicadas dezenas de novelas, contos e peças de teatro.
Tuesday Oct 5 2021